segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

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Olha, é só para avisar que eu já vou embora. Mas eu deixo sua chave embaixo do tapete, para que alguém possa entrar em meu lugar.
Eu me desculpo por ir assim, dessa forma. Nós dois sabemos que a culpa foi mal atribuída até aqui. Não é só você, nem meu eu em você, nem nada mais de você. Mas sou eu, a menina que ainda não aprendeu a gostar fragmentando as coisas, que não consegue aceitar outros muros além do seu.
Somos todos tão egoístas, e eu não vou me dividir para trocar pedaços com você.
Eu não aprendi a ser só número até hoje, nem tempo verbal.
Não sou classe gramatical, também. Eu não ligo termos nem dou nome às coisas. Embora possa parecer que é só o que tenho feito.

E agora eu faço algo por mim. E é óbvio que todos os outros não fariam o mesmo. "Somos, agora, iguais a todos eles, então? "Somos iguais, somos nós dois?
Não me desculpe.  Agora eu já nem ouço. Me lembro de algumas palavras ofensivas, mesmo tendo jogado todas elas para fora do meu quadro. Eu não minto. Não sou assim. Não concordo. Não é justo, sincero. Não é bonito.

Me lembro quando ele me falou sobre o tempo dizer algo e já faz mais de quatro anos. E quando eu fui até lá, as mãos trêmulas feito as pernas, só para dizer coisas bonitas... Ele não ouviu, porque estava dormindo.
Por isso é melhor eu esquecer as flores.
Eu deixo tua chave. Palavra.

Já deve saber para onde estou indo. Mas não importa. Não te fará falta. Não te fará nada.
A princípio, achei que me puxaria com força e me pediria para ficar mais, respirar mais perto de você e compartilharmos nossas presenças.
Por que me seguraria, se é tudo exagero meu? É tudo desnecessário. Isso não importa.

Se foram aqueles dias na calçada e a minha falta de coragem, ou se foi aquele céu bonito que perdemos por ignorância, eu não sei. Mas eu teria me arriscado ainda mais caso você se lembrasse. Se ao menos uma vez você pudesse não esquecer!
Mas indiferença pode dar em vários tipos de solo.
Não é só. Isso não é tudo. Isso é tudo que falta. Mas vamos esquecer. Você está quase lá, uma hora eu chego também.
Porque você vai me deixar ir, que eu sei.
E não tem essa de coisa incompleta não, meu bem. É só que nós somos muito fracos para abandonar nossas histórias, por medo de que não venham outras tão boas quanto ou até melhores e perdemos coisas, pessoas, como se o mundo só soubesse tirar, arrancar, levar. Mas não. A gente ganha também. E aprende.

Não te escreverei mais cartas. Aquela foi a última e está embaixo do tapete com a chave.
Se não quiser ler, não precisa. É desnecessário também.

Hoje foi o nosso último debate sobre aquele assunto na escola.
Eu já estou certa de que não sou como você. Não sou somente química e biologia. E não! Não sou só matemática também!
Sou mais artes! Com cores, grafite, margem de 2 cm. Dibujos de Laurita.

Quando me perceber, se acaso o fizer um dia, leia a carta de novo. Olhe a foto. Pense em como fomos extravagantes. Em como eu fui intensa e você mesquinho.
Eu tenho um livro com a definição de todos eles, além da minha lista. Estava quase pronta para te mostrar, mas você já tinha escrito a sua. Pena não ter me escrito algo também. Pena não ter sido menino o suficiente.

Ser mulher, era o que aquela moça vivia dizendo, é deixar de desenhar corações na perna e em guardanapos? Escolher o que vai sentir, em níveis? É deixar os meses passarem como se duas mãos tão juntas não fossem nada além de mãos com dedos, unhas e pintas?
Ser sensata é não chorar quando o coração parece estar diminuindo dentro da gente? É não gritar no portão do amigo, de tanta saudade que às vezes dá?

 Pois eu sou uma menina. Desde os tempos da mesa de sinuca e o cabelo vermelho até o depois disso.
Sou menina com maria-chiquinha e vestido xadrez. Com cartas, doces e risadas estranhas.

Eu já tentei ser seca, lisa e reta.
Mas eu sou menina, tão tão tão menina que já estou indo embora.


5 comentários:

Clara Moriá disse...

ai, gente, sofri.

Unknown disse...

acho estranho e bom quando me deparo com um texto que diz aquilo que penso/sinto/sou com as palavras de quem eu nem conheço.

AquilesMarchel disse...

lindo
demais

arrepiei


primeira visita mt valida

Anônimo disse...

Linda!

Camila Avelar disse...

ficou ótimo.